Barack Obama foi eleito o 44º presidente dos Estados Unidos. Aos 47
anos, ele torna-se o primeiro negro a governar o país, ao derrotar o
rival republicano John McCain.
Depois de oito anos do governo republicano de George W. Bush, os
norte-americanos aceitaram a proposta repetida pelo novo eleito.
Bradando lemas como "Precisamos de mudança", Obama substituirá um líder
que chegou a ser aclamado pelo pulso firme na guerra antiterrorismo, mas
que deixou o posto desgastado por duas guerras, além da recente crise
financeira.
Ainda com a apuração dos votos em andamento, o senador John McCain,
72, com base nos dados das projeções, admitiu a derrota em um discurso
em Phoenix (Arizona), por volta das 2h15 (horário de Brasília), em que
agradeceu seus eleitores e informou ter telefonado para parabenizar
Obama. Ao mesmo tempo em que ele discursava, uma multidão se aglomerava à
espera do discurso da vitória de Obama no Grant Park, em Chicago.
Obama bateu McCain em Estados-chave, como Ohio, Pensilvânia, New
Hampshire, Iowa e Novo México. Ele irá para a Casa Branca com o Partido
Democrata no controle da Câmara e do Senado.
Apesar de a economia em colapso ser a prioridade do novo governo,
Obama promete, entre outras medidas, estabelecer novos padrões na
política internacional. O fim da guerra do Iraque é uma das principais metas, além de ações diplomáticas no Oriente Médio, que incluem o diálogo com Irã e Síria.
As tropas norte-americanas devem se limitar ao Afeganistão,
no combate à Al Qaeda. No plano econômico, Obama terá a dura missão de
cumprir os prometidos cortes de impostos à classe média.
Nos últimos meses, as pesquisas de intenção de voto já acusavam uma
consistente vantagem democrata. Alguns temores ainda dissipavam a
certeza da vitória - entre eles, o racismo.
O democrata deixou claro que não se serviria da questão racial durante sua campanha, mas a candidatura dele empolgou os negros,
que formam cerca de 12% da população norte-americana. A questão racial
apareceu algumas vezes, entre elas durante as prévias do Partido
Democrata, nas quais Obama derrotou a ex-primeira-dama Hillary Clinton.
Tratando da polêmica, Obama pediu o fim dos conflitos raciais em
discurso.
Longe de ser o "azarão" da disputa, Obama teve o endosso de uma
campanha milionária - a mais rica da história das eleições do país. Com
uma estratégia certeira, se aproximou dos jovens e os fez um eleitorado
ativo na campanha. Para seus simpatizantes, Obama é um político único e
estimulante como o presidente John F. Kennedy. Seus adversários o acusam
de ser um mero orador eloqüente, de idéias ingênuas e políticas
econômicas que tendem ao socialismo.
Senador de primeiro mandato, contra sua inexperiência, Obama terá o reforço de seu vice-presidente, Joe Biden,
senador por Delaware. Um dos políticos há mais tempo em atividade no
país, tem seis mandatos no Senado. Desde 2001, ele preside o Comitê de
Relações Internacionais e sua trajetória é fortemente ligada às questões
de política externa. Biden também é membro do Comitê Judiciário do
Senado, e é um dos líderes nas questões de combate ao terrorismo e ao
tráfico de drogas.
Nascido em 4 de agosto de 1961, em Honolulu, Havaí, Barack Obama é casado com Michelle,
com quem tem duas filhas, Malia e Natasha. Filho de um queniano e uma
norte-americana do Kansas, Obama tem parte da família ainda na África.
Na infância, viveu durante anos em Jacarta (Indonésia) após o
divórcio dos pais e o novo casamento da mãe. Aluno de Harvard, Obama foi
o primeiro negro a presidir a prestigiosa revista universitária
"Harvard Law Review" e, em 2004, ingressou no Senado.
Barack Obama - uma vida americana
A
biografia excepcional de Barack Obama e sua campanha vitoriosa à
Presidência dos EUA iniciaram um novo capítulo na política americana.
O presidente Obama, o primeiro presidente afro-americano dos Estados
Unidos, tem uma história de vida diferente de todos os outros líderes
americanos até então. Filho de pai queniano e mãe branca da região
central dos EUA, Obama ganhou proeminência nacional com um discurso
bem-recebido na Convenção Nacional Democrata em 2004, o mesmo ano em que
foi eleito para o Senado americano pelo Estado de Illinois. Depois
disso, em apenas quatro anos alcançou o mesmo patamar de pesos pesados
democratas para arrebatar a indicação de seu partido à Casa Branca e
ganhar a eleição presidencial concorrendo contra o senador republicano
John McCain.
Com jeito refinado de falar, domínio de uma retórica eloqüente e
elevada, capacidade de inspirar o entusiasmo de jovens eleitores e o uso
sofisticado da internet como ferramenta de campanha, Obama foi de fato
um candidato do século 21. Em sua campanha, Obama enfatizou dois grandes
temas: mudar o modo tradicional de Washington conduzir os negócios da
nação e convocar os americanos de diferentes backgrounds ideológicos,
sociais e raciais a se unir para o bem comum.
“Não há Estados Unidos de liberais nem Estados Unidos de
conservadores — há os Estados Unidos da América”, disse Obama em seu
discurso na Convenção Nacional Democrata de 2004. “Não há Estados Unidos
de negros nem Estados Unidos de brancos, nem Estados Unidos de latinos,
nem Estados Unidos de asiáticos; há os Estados Unidos da América. (…)
Somos um único povo, todos nós prometendo lealdade à bandeira americana,
todos nós defendendo os Estados Unidos da América.”
Os primeiros anos
Os pais de Obama eram de origens muito diversas. Sua mãe, Ann Dunham,
nasceu e foi criada em uma pequena cidade do Kansas. Depois que sua
família se mudou para o Havaí, ela conheceu Barack Obama Sr., bolsista
queniano matriculado na Universidade do Havaí. Eles se casaram em 1959, e
em 4 de agosto de 1961 Barack Obama Jr. nasceu em Honolulu. Dois anos
depois, Obama pai deixou sua nova família, primeiro para fazer
pós-graduação em Harvard e depois por um emprego como economista do
governo de volta ao Quênia. O jovem Obama encontrou-se com seu pai
novamente apenas uma vez, aos 10 anos.
Quando Obama tinha 6 anos, sua mãe se casou de novo, desta vez com um
executivo indonésio do petróleo. A família mudou-se para a Indonésia, e
durante quatro anos Obama freqüentou a escola na capital Jacarta. Ele
acabou retornando ao Havaí, onde morou com seus avós maternos e cursou o
ensino médio.
Em seu primeiro livro, A Origem dos Meus Sonhos (Dreams from My
Father), Obama descreve esse período de sua vida como sendo mais
turbulento do que o usual na vida dos adolescentes, pois ele se debatia
para entender sua herança birracial em uma época em que isso ainda era
relativamente pouco comum nos Estados Unidos. Ter raízes tanto na
cultura negra quanto na cultura branca pode ter ajudado a dar a Obama a
visão ampla que ele levou para a política anos depois, entendendo muitos
pontos de vista.“Barack tem uma capacidade incrível de sintetizar
realidades aparentemente contraditórias e as tornar coerentes”, disse
sua colega da faculdade de Direito Cassandra Butts à redatora da revista
New Yorker Larissa MacFarquhar. “Isso é resultado de ser criado por uma
família branca e depois sair para o mundo e ser visto como negro.”
Obama deixou o Havaí para cursar o Occidental College em Los Angeles
por dois anos. Mais tarde mudou-se para a cidade de Nova York e obteve o
bacharelado em Humanidades pela Universidade de Colúmbia em 1983. Em
discurso proferido em 2008, Obama descreveu seu pensamento à época: “…
quando me formei na faculdade, estava tomado por uma idéia maluca — iria
trabalhar com as comunidades de base para conseguir mudar as coisas.”
Convocado para o Serviço Público
Em busca de sua identidade e de rumo na vida, Obama em seguida deixou
seu trabalho como redator de finanças em uma consultoria internacional
em Nova York e mudou-se para Chicago em 1985. Lá, trabalhou como
organizador comunitário para uma coalizão de igrejas locais no lado sul
da cidade, área afro-americana pobre e duramente afetada pela transição
de centro de manufatura para economia de serviços.
“Foi nesses bairros que recebi a melhor educação que já tive e
aprendi o verdadeiro significado de minha fé cristã”, contou Obama anos
depois no discurso em que anunciou sua candidatura presidencial.Obama teve alguns sucessos tangíveis em seu trabalho, dando aos moradores do lado sul voz em questões como redesenvolvimento econômico, capacitação profissional e esforços de limpeza ambiental. No entanto, considerava que sua função principal era a de organizador comunitário, de um catalisador que mobiliza cidadãos comuns em um esforço a partir das bases para forjar estratégias locais com vistas à autonomia política e econômica.
Depois de três anos desse trabalho, Obama concluiu que, para conseguir melhorias reais nessas comunidades tão carentes, era necessário o envolvimento em esferas mais altas, no âmbito jurídico e político. Assim, ele cursou a Escola de Direito de Harvard, onde se destacou ao ser eleito o primeiro presidente negro da prestigiada publicação Harvard Law Review e ao formar-se em Direito magna cum laude, em 1991.
Com essas credenciais, “Obama conseguiria fazer tudo o que quisesse”,
observou David Axelrod, estrategista de sua campanha à Presidência.
Obama retornou à sua cidade adotada de Chicago, onde exerceu a profissão
na área de direitos civis e lecionou Direito Constitucional na
Universidade de Chicago. Em 1992 casou-se com Michelle Robinson, também
formada em Direito por Harvard, e trabalhou para o registro dos
eleitores em Chicago com o intuito de ajudar candidatos democratas como
Bill Clinton.
Cada vez mais compromissado com o serviço público, Obama decidiu
concorrer pela primeira vez a um cargo eletivo em 1996, ganhando uma
cadeira por Chicago no Senado estadual de Illinois. De muitas maneiras, a
disputa foi um desdobramento lógico de seu trabalho anterior como
organizador comunitário, e Obama levou muito daquela mesma perspectiva
ampla — o político como facilitador de esforços de base voltados para o
cidadão e construtor de amplas coalizões — para a sua visão de política.
“Qualquer afro-americano que apenas fale do racismo como uma barreira
ao nosso sucesso está seriamente equivocado se também não combater de
frente as forças econômicas maiores que criam insegurança econômica para
todos os trabalhadores — brancos, latinos e asiáticos”, disse na época.
Entre suas realizações na esfera legislativa nos oito anos que se
seguiram no Senado estadual, estiveram a reforma do financiamento de
campanhas, reduções fiscais para a classe trabalhadora pobre e melhorias
no sistema de Justiça Criminal do Estado.
Palco nacional
Em 2000, Obama concorreu pela primeira vez ao Congresso dos EUA e não
conseguiu vencer Bobby Rush, democrata que concorria à reeleição por
Chicago para a Câmara dos Deputados. Desanimado pela derrota esmagadora
para Rush nas primárias e buscando obter influência além do Legislativo
estadual de Illinois, convenceu Michelle da idéia de concorrer ao Senado
dos EUA em uma estratégia arriscada de “tudo ou nada” para fazer
avançar sua carreira política.
Em 2004, a disputa pelo Senado em Illinois havia se transformado em
um vale-tudo, quando no ano anterior o republicano Peter Fitzgerald, que
ocupava a vaga, anunciou que não concorreria à reeleição. Sete
democratas e oito republicanos participaram das primárias de seus
respectivos partidos para obter a indicação ao Senado. Obama conseguiu a
indicação democrata com facilidade, obtendo mais votos — 53% — do que a
soma de seus seis adversários.
Com os republicanos então detendo uma leve maioria das 100 vagas do
Senado (51 cadeiras), os democratas viram a disputa pelo Senado em
Illinois como crucial para suas chances de retomar o Senado em novembro
daquele ano (na verdade, só conseguiram obter o controle novamente em
2006). O desejo de dar impulso à campanha de Obama com uma atuação de
destaque na convenção, suas conhecidas habilidades de oratória e a
impressão altamente favorável causada no candidato à Presidência John
Kerry selaram a decisão de escolher Obama como o principal orador da
convenção.
O discurso de Obama, com sua linguagem requintada e refinada sobre a
necessidade de transcender as divisões partidárias e seu chamado para
uma “política de esperança” em vez de uma política de cinismo, fez mais
do que animar os participantes da convenção: catapultou Obama na mídia
nacional como uma estrela em ascensão do Partido Democrata. Ele seguiu
em frente e ganhou com folga a disputa pelo Senado naquele outono,
obtendo vitória esmagadora com 70% do voto popular. Embora a desordem
quase total entre os republicanos em Illinois naquele ano tenha sem
dúvida contribuído para essa grande diferença, a vitória de Obama foi
impressionante, pois ele ganhou em 93 dos 102 condados do estado e
atraiu eleitores brancos em uma margem superior a dois para um.
A reputação de Obama como um novo tipo de político, alguém capaz de
superar divisões raciais tradicionais, não parou de crescer. Em um
perfil dele para a revista New Yorker, o escritor William Finnegan,
comentando seu talento para “sutilmente usar a mesma linguagem de seu
interlocutor”, disse que ele “fala a gama completa de vernáculos
americanos”. Obama deu sua própria explicação de porque consegue se
conectar com os eleitores brancos.
“Conheço essas pessoas”, disse. “São meus avós. (…) Seus modos, suas
sensibilidades, seu sentido de certo e errado — tudo isso é totalmente
familiar para mim.”No Senado, Obama acumulou um histórico de votação afinada com a ala liberal do Partido Democrata. A crítica à guerra do Iraque tem sido uma de suas marcas registradas, remontando a um discurso de 2002, mesmo antes de a guerra começar, quando ele advertia que qualquer ação militar seria baseada “não em princípios, mas em política”. Ele também trabalhou para fortalecer padrões éticos no Congresso, melhorar o atendimento para veteranos do serviço militar e aumentar o uso de combustíveis renováveis.
Candidato a presidente
A longa campanha democrata das eleições primárias de 2008, com
eleições ou caucuses (prévias) em todos os 50 Estados, foi histórica por
diversas razões. Afro-americanos e mulheres já haviam concorrido à
Presidência anteriormente, mas desta vez os dois principais candidatos
eram uma mulher e um afro-americano. Quando Barack Obama e sete outros
candidatos à indicação presidencial democrata começaram a se organizar
em 2007, as pesquisas de opinião geralmente o colocavam em segundo
lugar, atrás da suposta favorita senadora por Nova York Hillary Clinton.
Obama, no entanto, foi extremamente bem-sucedido na primeira fase da
disputa ao envolver um grupo entusiasmado de simpatizantes, em especial
entre os jovens, criando uma organização de campanha com base nacional e
arrecadação de fundos pela internet.
Com Hillary Clinton desfrutando de maior popularidade, uma máquina de
campanha mais azeitada e apoio estadual de líderes democratas, a equipe
de Obama concebeu uma estratégia inovadora para anular essas vantagens:
concentrar-se em Estados com prévias em vez de primárias para a escolha
dos delegados e em Estados menores que tradicionalmente votam nos
republicanos na eleição geral. Essa abordagem capitalizou o sistema de
representação proporcional do Partido Democrata — que atribui os
delegados das convenções de cada estado proporcionalmente à participação
de voto de cada candidato — em oposição ao sistema dos republicanos que
atribui a maioria ou todos os delegados da convenção ao vencedor em
cada Estado.
A estratégia deu certo nas primeiras prévias nacionais, realizadas em
Iowa em 3 de janeiro de 2008, quando Obama faturou uma vitória
indigesta para Hillary Clinton. A vitória de Iowa mudou as regras do
jogo, como opinou o Washington Post: “Derrotar Hillary Clinton… alterou o
curso da disputa ao estabelecer Obama como seu principal rival — o
único candidato com mensagem, estofo organizacional e recursos
financeiros para desafiar sua situação de favorita.”
Deu certo mais uma vez na “Superterça” — eleições realizadas
simultaneamente em 22 estados em 5 de fevereiro —, quando Obama travou
uma briga de foice com Hillary e conquistou os Estados rurais do Oeste e
do Sul. E deu certo novamente quando Obama seguiu em frente e ganhou
dez disputas consecutivas em fevereiro, solidificando a liderança em
delegados que Hillary nunca mais conseguiria alcançar.
Uma Presidência de Obama
Barack Obama está entre os presidentes mais jovens dos EUA. Nascido
no fim da geração baby boom de 1946-1964, ele também é o primeiro
presidente que se tornou adulto na década de 1980, o que por si só pode
indicar mudança. A atmosfera na qual ele cresceu foi significativamente
diferente dos tumultuados anos 1960 que moldaram a perspectiva da
geração dos primeiros anos do baby boom. Como disse certa vez Obama
sobre as eleições presidenciais de 2000 e 2004, disputadas por
candidatos de um grupo muito anterior àquela geração pós-guerra:
“Algumas vezes me senti como se estivesse assistindo ao psicodrama da
geração baby boom — um conto enraizado em velhos ressentimentos e
enredos de vingança nascidos em alguns campi universitários há muito
tempo — encenado no palco nacional.”
Larissa MacFarquhar, da New Yorker, tem uma teoria sobre o notável
apelo de Obama em linhas políticas tradicionais. “O histórico de votação
de Obama é um dos mais liberais no Senado”, observou, “mas ele sempre
atraiu os republicanos, talvez porque fale sobre metas liberais com uma
linguagem conservadora”.
“Na sua visão de história, no seu respeito pela tradição, em seu
ceticismo de que o mundo possa ser mudado de qualquer modo, mas muito,
muito lentamente”, ela escreveu, “Obama é profundamente conservador”.
O presidente Obama abriu novos caminhos na política americana. Sua
candidatura surgiu precisamente no momento em que muitos americanos
acreditavam que o país precisava de uma transformação fundamental em seu
rumo. A colunista política do Washington Post E.J. Dionne talvez tenha
resumido de modo perfeito a causalidade entre a candidatura de Obama e o
zeitgeist (espírito da época) americano quando escreveu:
Mudança, e não experiência, foi a ordem do dia.Ímpeto, e não o
domínio dos detalhes, foi a virtude mais valorizada na oratória da
campanha. Uma quebra clara com o passado, e não meramente um retorno a
melhores dias, foi a promessa mais valorizada.
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