Joana I, a Louca (Toledo, 6 de
Novembro de 1479 — Tordesilhas, 11 de Abril de 1555), La Loca em
espanhol, a terceira filha de Fernando II de Aragão e Isabel I de
Castela, foi rainha de Castela (1504-1555) e Aragão (1516-1555) e mãe de
Carlos V de Habsburgo do Sacro Império Romano-Germânico.
Infanta da Coroa de Castela
Desde pequena considerada muito
bela e inteligente, recebeu uma esmerada educação, própria a uma infanta
e improvável herdeira da Castela, baseada na obediência, ao contrário
da exposição pública e da aprendizagem de governo, requeridos na
instrução de um príncipe. No estrito e itinerante ambiente da corte
castelhana da sua época, Joana foi uma boa aluna no comportamento
religioso, urbanidade, boas maneiras e comportamento próprios da corte,
sem esquecer as artes, como a dança e a música, entretenimento como a
equitação e o conhecimento das línguas românicas da Península Ibérica
para além do francês e do latim. Entre os seus principais preceptores se
encontraram o sacerdote dominicano Andrés de Miranda, a amiga e tutora
da rainha Isabel, Beatriz Galindo, apelidada de "a latina" e,
provavelmente a sua mãe.
A casa real incluía religiosos
(confessor, sacristão, distribuidor de esmolas e capelões), oficiais
administrativos (mordomos, camareiros, cavalariços, todos nas suas
hierarquias, e ainda um contador, um tesoureiro e um secretário),
pessoal encarregado da alimentação (cozinheiros, mestre-sala, padeiro,
reposteiro, copeiros e catadores), pessoal encarregado da saúde e
protecção, e outro pessoal (criadas e escravas canárias),
meticulosamente seleccionados por seus pais sem a sua participação. Ao
contrário de Joana, o seu irmão, D. João de Aragão, Príncipe das
Astúrias e de Gerona, começou a encarregar-se da casa e das posses
territoriais como treino para o governo do seu futuro reino.
Arquiduquesa, duquesa, condessa e senhora
Como era costume na Europa da
época, Isabel e Fernando negociaram os casamentos de todos os seus
filhos de modo a assegurar objectivos diplomáticos e estratégicos.
Conscientes das aptidões de Joana e do seu possível desempenho em outra
corte, bem como da necessidade de reforçar os laços com o Sacro
Imperador Romano-Germânico, Maximiliano I da Germânia, contra os cada
vez mais hegemónicos monarcas franceses da dinastia Valois, ofereceram
Joana ao seu filho, Filipe, arquiduque da Áustria, duque da Borgonha,
Brabante, Limburgo e Luxemburgo, conde da Flandres, Habsburgo, Hainaut,
Holanda, Zelândia, Tirol e Artois, e senhor de Amberes e Malinas entre
outras cidades.
Joana a Louca e Filipe o Belo
Em troca deste casamento, os
Reis Católicos pediram a mão da filha de Maximiliano, Margarida de
Habsburgo, para o príncipe João. Curiosamente, Joana tinha sido
considerada pelo Delfim Carlos, herdeiro do trono francês, e em 1489
pedida em matrimónio por Jaime IV, rei da Escócia.
Em Agosto de 1496, a futura
arquiduquesa partiu da praia de Laredo, Cantábria, em uma das carracas
genovesas ao comando do capitão Juan Pérez. Para demonstrar o esplendor
da coroa castelhana às terras do norte, e o seu poderio ao hostil rei
francês, a frota também incluía outros 131 navios, de naus a caravelas,
com uma tripulação de 15.000 homens.
Joana despediu-se de sua mãe e
irmãos, e iniciou a viagem para a longínqua e desconhecida terra
flamenga, lar do futuro esposo. A travessia teve alguns contratempos
que, em primeiro lugar, obrigaram a frota a refugiar-se em Portland,
Inglaterra, a 31 de Agosto. Quando finalmente a frota pôde chegar a
Middelburg, Zelândia, uma carraca genovesa que transportava 700 homens, o
guarda-roupa de Joana e muitos dos seus haveres pessoais, encalhou num
banco de pedras e areia e afundou-se.
Filipe encontrava-se na Alemanha
e não foi receber a sua noiva, devido à oposição dos conselheiros
francófilos, que tencionavam convencer Maximiliano da inconveniência de
uma aliança com a Coroa de Castela, e das virtudes de uma aliança com a
França. O ambiente da corte no qual Joana se encontrou era radicalmente
oposto ao que viveu na coroa castelã. Por um lado, a sóbria, religiosa e
familiar corte castelhana contrastava com a festiva, desinibida e
individualista corte borgonho-flamenca. Aquando da morte da imperatriz
Maria de Borgonha, a casa de Filipe, de 4 anos, tinha sido rapidamente
dominada pelos grandes nobres borgonheses. Ao contrário da Coroa de
Castela, as grandes decisões eram tomadas de acordo com os interesses
destes importantes nobres através do influenciável Filipe.
Apesar de os futuros esposos não
se conhecerem, houve bom entendimento entre eles e conta-se que se
apaixonaram à primeira vista. A cerimónia foi realizada em Lille,
Flandres, a 21 de Outubro de 1496. Não obstante, o casamento não impediu
Filipe de ter aventuras amorosas com outras damas, o que fez nascer em
Joana ciúmes patológicos. Falava-se de violentos confrontos do casal e
que Joana chegara mesmo a agredir uma dama com um pente, suspeitando ser
esta uma das amantes do marido. Em pouco tempo chegaram os filhos, o
que agudizou os ciúmes de Joana.
Em 24 de Novembro de 1498, na
cidade de Lovaina, nos arredores de Bruxelas, nascia a primogénita,
Leonor, assim baptizada em honra de Leonor de Portugal, avó paterna de
Filipe, que teria enlouquecido de desgosto pela morte do marido. Joana
vigiava constantemente o seu esposo. Apesar do avançado estado de
gestação da sua segunda gravidez, da qual nasceria Carlos a 24 de
Fevereiro de 1500, assistiu a uma festa no palácio de Gante. No mesmo
dia nasceu o seu filho, segundo se diz, nos lavabos do palácio. No ano
seguinte, a 18 de Julho de 1501, em Bruxelas, nascia a sua terceira
filha, chamada Isabel em honra de Isabel de Portugal, rainha de Castela,
sua avó materna.
Rainha da Coroa de Castela
Testamento assinado de Isabel I de Castela
Joana foi elevada ao trono por mortes na família:
- em 1497 morreu seu irmão João, príncipe das Astúrias;
- o filho deste morreu à nascença;
- em 1498 morreu sua irmã Isabel de Aragão e Castela, Rainha de Portugal, casada com o rei D. Manuel I de Portugal;
- em 1500 morreu o filho desta, o príncipe Miguel da Paz, Príncipe de Portugal e das Astúrias.
Assim, Joana e Filipe foram
jurados herdeiros em 1502. Em Dezembro de 1502, Filipe voltou para as
terras da Flandres, o que parece ter agravado o estado mental de Joana.
Já demonstrando debilidade mental, foi inicialmente detida pela mãe na
Coroa de Castela. Mas em Março de 1504 Joana saiu de Medina del Campo
para a Flandres. Havia violentos choques entre a política
flamenco-borgonhesa do marido Habsburgo com a política do seu pai,
Fernando II de Aragão. Pelo I Tratado de Blois, em 22 de Setembro de
1504, sem autorização do sogro, Filipe dispôs com Luís XII de França o
casamento de Carlos de Gante, seu filho de 4 anos de idade, com uma das
filhas do rei, Cláudia ou Renata, comprometendo os direitos e a
conquista de Nápoles.
A sua mãe Isabel morreu em 25 de
Novembro de 1504. Joana foi proclamada rainha de Castela em 26 de
Novembro e reconhecida pelas Cortes de Toro em 11 de Janeiro de 1505. O
testamento encarregava Fernando II de Aragão da administração e governo
da sua Coroa de Castela; a rainha proibia a concessão de cargos
castelhanos a estrangeiros e determinava ainda que, caso Joana
manifestasse sintomas de desequilíbrio, a coroa devia ser regida por seu
pai.
Na concórdia de Salamanca (1505)
acordou-se o governo conjunto de Filipe, Fernando de Aragão e da
própria Joana, mas devido a acusações de alienação mental desta, Filipe e
Fernando continuaram a lutar pelo poder, contando o primeiro com apoio
da maior parte da nobreza. Com o casamento, Filipe recebera títulos
nobiliárquios - duque da Borgonha, Brabante, Limburgo e Luxemburgo,
conde da Flandres, Habsburgo, Hainaut, Holanda, Zelândia, Tirol e
Artois, e senhor de Amberes e Malinas entre outras cidades.
Criaram-se dois partidos: o
partido que apoiava Filipe, dirigido por Pedro Manrique de Lara, Duque
de Najera, Alonso de Pimentel, Conde de Benavente, pelos marqueses de
Villena, Zenete e Priego, pelos Duques de Medina Sidonia e Bejar, e pelo
conde de Ureña. Joana retirou-se temporariamente para a corte de
Bruxelas, onde a 15 de Setembro deu à luz o seu quinto filho, Maria. A
12 de Outubro Fernando II de Aragão firmou o II Tratado de Blois, em que
combinou o seu casamento com Germana de Foix, sobrinha de Luís XII,
para contrabalançar o ganho político de Filipe com o I Tratado de Blois.
Pelo Tratado de Windsor, em 9 de
Fevereiro de 1506, assinado com o Henrique VII rei da Inglaterra ficou
determinado que Carlos de Gante casaria com Maria Tudor, e o seu filho
Henrique com Margarida da Áustria, irmã de Filipe I.
Houve algumas tentativas de
conciliação mas Fernando acabou por renunciar ao poder da Coroa de
Castela para evitar um confronto armado. A 27 de Junho, reconhecendo a
alienação mental da filha, assinou o Tratado de Villafáfila, renunciando
aos seus direitos e retirando-se para Aragão. As Cortes de 9 de Julho
proclamaram Joana como rainha de Castela, Filipe como rei consorte e o
filho Carlos como herdeiro.
Filipe isolou Joana e governou,
reorganizando cargos e ofícios, concedendo privilégios e mercês aos
nobres castelhanos e flamengos. D. Juan Manuel, senhor de Belmonte e
presidente do Real Conselho, Filiberto de Veyre (apelidado La Mouche),
João de Luxemburgo, senhor de Ville, e Garcilaso de la Vega, comendador
de Leão foram figuras centrais do breve período de regência do
Habsburgo.
Filipe deteria a coroa até 25 de
Setembro do mesmo ano, quando morreu repentinamente, em circunstâncias
suspeitas. A peste açoitava o país. Suspeitou-se de envenenamento. Outra
hipótese dizia que estava a jogar à pelota, em que se destacava, e
depois da partida bebeu um jarro de água gelada que provocou uma febre
intensa que o matou. Fernando II de Aragão e o cardeal de Cisneros
recuperaram o poder.
Viúva
Doña Juana la Loca (1877), de Francisco Pradilla y Ortiz. Museu do Prado (Madrid)
Joana recusou viver em Arévalo,
onde estivera encerrada a sua avó portuguesa, louca. Em 1 de Novembro de
1506, dia de finados, a Rainha Joana deu ordens para abrir o caixão do
marido, sepultado no esplêndido Panteão Real da Cartuja de Miraflores,
em Burgos, onde morrera. Segundo os últimos desejos de Filipe, levou o
seu corpo para Granada (excepto o seu coração que pediu que enviassem a
Bruxelas, o que se realizou).
Conta-se que fez embalsamar o
corpo, vestiu o cadáver com grande pompa e o levou consigo, encabeçando o
cortejo fúnebre, viajando sempre à noite, afastada dos locais onde
mulheres pudessem ter contacto com ele. Durante oito frios meses por
terras castelhanas, a rainha Joana não se separará por um momento do
caixão, acompanhada por um grande número de pessoas, entre as quais
religiosos, nobres, damas de companhia, soldados e diversos criados. Nas
povoações por que passavam, aumentavam os rumores da sua loucura. Ao
fim de alguns meses, os nobres "obrigados" pela sua posição a seguir a
rainha, sentiam-se a perder tempo com esta "loucura" em ver de se
ocuparem como deveriam das suas terras. Na cidade de Torquemada, a 14 de
Janeiro de 1507, dá à luz o sexto filho, póstumo, do seu marido, uma
menina baptizada com o nome de Catarina. A demência da rainha
agravava-se. Não queria trocar de roupa nem lavar-se.
Por fim, Fernando II de Aragão,
segundo a última vontade de Isabel I de Castela, decidiu encerrá-la, com
a pequena Catarina, em Tordesilhas, em Fevereiro de 1509. Com a morte
de Fernando II, Carlos I de Espanha tomou o poder. Catarina saiu da
companhia da mãe para se casar com João III de Portugal, mas Joana viveu
lá durante 46 anos, sem sair do seu palácio.
A literatura romântica fez dela a
figura enlouquecida por ciúmes, mas herdara da avó a esquizofrenia que
recairia em D. Carlos, seu neto.
Sepultada na igreja mudejar de
Santa Clara, seu corpo foi transladado em 1574 para a Capela Real de
Granada, junto ao do marido, sendo o castelo de Tordesilhas, onde
morreu, demolido em 1771.
Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre.
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